A
Revista Agriculturas tem como objetivo dar visibilidade a iniciativas
de promoção da agroecologia desenvolvidas por famílias e organizações
camponesas no Brasil e em outros países, sobretudo da América Latina. Os
artigos em geral são elaborados por pessoas diretamente envolvidas na
construção dessas práticas. Ao divulgarem suas experiências na revista,
elas estão interessadas em partilhar seus ensinamentos e dúvidas com
outros grupos engajados na promoção da agricultura familiar ecológica.
Por meio de artigos curtos e de linguagem simples, as experiências
apresentadas têm sido importante fonte de inspiração para que outras
iniciativas floresçam e se multipliquem. Além disso, por abordar os
princípios técnicos e metodológicos do enfoque agroecológico, a revista
também tem sido empregada com sucesso como material de suporte
pedagógico em programas de formação em agroecologia.
Via Campesina apresenta críticas à economia verde a dirigente da ONU
Posted: 20 Jun 2012 08:38 AM PDT
*do site do MST
Por Cristiane Passos
No final da tarde do último sábado (16),
foi promovido um debate entre representantes da Via Campesina e de
organizações da sociedade civil com o presidente do PNUMA, Programa das
Nações Unidas para o Meio Ambiente, Achim Steiner, sobre economia verde,
a proposta da ONU e as reais implicações desta na vida das populações
do mundo.
Larissa
Parker, advogada da organização Terra de Direitos e membro do coletivo
Carta de Belém, inicou o debate questionando o presidente do PNUMA sobre
exemplos paupáveis de várias partes do mundo onde a implantação da
economia verde se mostra danosa.
A
financeirização e mercantilização do meio ambiente tornam a natureza um
ativo, um título no mercado, ficando sujeito à ação especulativa. Sendo
assim, como garantir, dentro da economia verde, a conservação
ambiental, já que sua escassez elevará seu valor de mercado?
Larissa
questionou, ainda, a engenharia de novas tecnologias propostas pela
ONU, como uma forma de manter o colonialismo e o discurso da erradicação
da pobreza, sem falar em distribuição de riquezas e de terras. Além
disso, esse modelo proposto pela ONU vem a ser uma nova roupagem da tão
falada revolução verde, que prometia o fim da fome com as tecnologias
desenvolvidas de sementes resistentes e novos pesticidas, e o que se viu
foi a continuidade da fome, o endividamento das famílias camponesas que
passaram a comprar esses produtos, o envenenamento da comida e, até
mesmo, a morte de camponeses e camponesas, principalmente na Índia,
desiludidos com essa forma de produção. “As alternativas estão
acontecendo, são visíveis, é preciso que a ONU olhe para elas, olhe para
os povos que aqui estão reunidos, e para as experiências em vários
territórios que aqui estão representados”, finalizou Parker.
Já
Edwin Vásquez, representante da Coica, organização indígena da bacia
amazônica, do Equador, interpelou o representante da ONU dizendo-lhe o
que para eles significaria economia verde. Uma economia verde, com
características limpas como querem remeter a ela as Nações Unidas,
seriam seus territórios e o que produzem neles, e não as empresas
petrolíferas, a produção de carvão ou a mineração. “Para nós, povos
indígenas e sem terra, a economia verde não é a cor do dinheiro, é a cor
da nossa Amazônia”, completou Vásquez.
Juan
Herrera, da Via Campesina, ressaltou a importância da luta dos povos
camponeses contra esse modelo proposto, principalmente, para beneficiar
os países ricos e o capitalismo. Segundo ele, a Via Campesina vem
lutando contra as mudanças climáticas, provocadas pelo modelo de
desenvolvimento do capital, e contra a fome, que também é resultado da
ganância do mercado e da não distribuição de terras e riquezas. Todo
esse trabalho da Via Campesina é contrário às soluções propostas pelo
capitalismo, que são sempre elaboradas com a finalidade de que o capital
possa sempre crescer mais. Juan aproveitou a ocasião para reforçar o
processo de luta da Via Campesina, “nós da Via Campesina vamos continuar
nas ruas lutando por todos os povos do mundo. A ONU propõe a
massificação do uso de transgênicos e agrotóxicos, e nós lutamos por uma
alimentação saudável para o nosso povo, e que todos tenham acesso a
ela”.
As interpretações da economia verde segundo a ONU
Segundo
Achim Steiner existem muitas interpretações diferentes para economia
verde e formas diversas de lidar com ela. Ele afirmou não discordar dos
questionamentos e análises feitas até o momento sobre o assunto e
assumiu que a ONU também ficou frustrada com o pouco avanço após a Eco
92. De acordo com ele, o pensamento econômico domina todas as nações,
pode não dominar em algumas comunidades, mas a ótica das nações é a
econômica. Afirmou, ainda, que o relatório do PNUMA como um todo seria
uma crítica aos mercados que não conseguiram aplicar o desenvolvimento
sustentável, definido como prioridade na Eco 92.
Sobre
as novas tecnologias Steiner destacou, “nossa visão é permitir que as
pessoas possarm ver o desenvolvimento sustentável como algo diferente do
que foi mostrado até agora. As tecnologias de energia renovável e
transgênicos são boas ferramentas, mas que foram apropriadas por grandes
multinacionais. O caminho foi feito de cima para baixo. As economias
não podem ser totalmente controladas por um lado ou por outro, elas
devem conviver e não ser dominada somente pelo mercado ou pelos
governos. Ao falar da economia, não falamos do modelo do passado, mas do
futuro”.
Já
Pat Mooney, da organização ETC Group, frisou que os governos estão no
lugar errado. Segundo ele, já que é aqui no espaço da Cúpula que a
economia se torna realidade, é aqui que estão as discussões importantes.
A
crise financeira que tem atingido boa parte do mundo foi causada pelos
sistemas financeiros. A crise das mudanças climáticas foi causada pelas
tecnologias que destruíram o meio ambeinte. Agora, de acordo com Mooney,
querem juntar essas duas crises e buscar uma solução. Crises essas que o
próprio mercado criou. “Como a economia verde vai fazer uma nova
tecnologia que resolva o que a outra destruiu? Essas tecnologias não são
verdes e não funcionam para nós, e quando digo isto não estou dizendo
que elas não são operativas, mas que não nos servem”, questionou ele.
“Não podemos permitir que esses que destruiram o sistema financeiro,
destruam o meio ambiente”, enfatizou.
O
representante da CUT, Arthur Henrique, destacou que não se pode aceitar
um modelo que mercantiliza os bens comuns. “Precisamos mudar o modelo
de produção e consumo no mundo. A própria ONU já admitiu que o modelo
não deu certo’, destacou. Os pilares ambiental e social ficaram para
último plano nos debates mundiais. O trabalho verde, segundo Arthur, é o
trabalho decente, não é apenas combater o trabalho escravo e o trabalho
infantil. “Não queremos só sermos ouvidos, queremos discutir juntos as
saídas para o desenvolvimentos sustentável”, encerrou ele.
Pablo
Solón, da Global South, interpelou Steiner questionando porque ele não
estava sendo sincero e não assumiu realmente os interesses do capital
sobre a economia verde. Segundo ele, a economia verde é para que os
países ricos continuem seu modelo de desenvolvimento, através de
políticas compensatórias como as REED’s e o crédito de carbono. E
concluiu criticando o modelo econômico preterido pelos países ricos, “o
modelo econômico não pode estar embasado na exploração indiscriminada da
natureza. Não necessitamos seguir crescendo eternamente, precisamos
redistribuir as riquezas e os recursos. Isso a economia verde não diz”.
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