LEFF, Enrique. Educação ambiental e desenvolvimento sustentável. In REIGOTA, Marcos (org.). Verde cotidiano: o meio ambiente em discussão. Rio de Janeiro: DP&A, 1999 (p.111-129).
“A questão ambiental emerge como uma crise de civilização” (Leff, 1999: 112).
“[as rupturas desta crise] questionam os
paradigmas do conhecimento, bem como os modelos societários da
modernidade, defendendo a necessidade de construir outra racionalidade
social, orientada por novos valores e saberes; por modos de produção
sustentados em bases ecológicas e significados culturais; por novas
formas de organização democrática” (Leff, 1999: 112).
“Esta mudança de paradigma social leva a
transformar a ordem econômica, política e cultural, que, por sua vez, é
impensável sem uma transformação das consciências e dos comportamentos
das pessoas. Nesse sentido, a educação se converte em um processo
estratégico com o propósito de formar os valores, as habilidades e as
capacidades para orientar a transição na direção da sustentabilidade”
(Leff, 1999: 112).
“A emergência da questão ambiental como
problema do desenvolvimento e a interdisciplinaridade como método para
um conhecimento integrado são respostas complementares à crise da
racionalidade da modernidade” (Leff, 1999: 113).
“Frente ao ideal do projeto científico
fundado na racionalidade formal e instrumental, de obter um controle
crescente do mundo, através de sua capacidade de predicação,
determinação e simplificação, a educação ambiental incorpora as
dimensões da complexidade, da desordem, desequilíbrio e da incerteza no
campo do conhecimento (Prigogine e Stenders 1984), afinados com os
princípios da ecologia e da termodinâmica de sistemas abertos” (Leff,
1999: 114).
“A produção sustentável emerge, assim,
como novo objeto científico interdisciplinar e a educação ambiental como
um instrumento para a construção da racionalidade ambiental” (Leff,
1999:114).
“A interdisciplinaridade foi um ponto de
referência constante dos projetos educativos, sobretudo no âmbito
universitário. (…) Sem dúvida, os avanços teóricos, epistemológicos e
metodológicos no terreno ambiental foram mais férteis no terreno
investigativo que eficazes na condução de programas educativos” (Leff,
1999: 115).
“As resistências teóricas e pedagógicas
fizeram com que muitos programas que susgiram com uma pretensão
interdisciplinar fracassassem perante a dificuldade de integrar os
paradigmas atuais de conhecimento” (Leff, 1999: 115).
“A educação ambiental requer a
construção de novos objetos interdisciplinares de estudo através da
problematização dos paradigmas dominantes, da formação dos docentes e da
incorporação do saber ambiental emergente em novos programas
curriculares” (Leff, 1999: 115).
“(…) seria necessário elaborar formas de
avaliação qualitativa dos métodos da complexidade da ciência pós-normal
(funtowics e Ravetz, 1994) aplicados à educação ambiental,
desobrigando-a dos princípios da ciência positiva” (Leff, 1999: 116).
“Ainda que se tenha dado um
desenvolvimento do saber ambiental em várias temáticas das ciências
naturais e sociais, estes conhecimentos não se incorporaram plenamente
aos conteúdos curriculares de novos programas educativos” (Leff, 1999:
116-117).
“Com a emergência da
interdisciplinaridade e da complexidade, também surgiu uma filosofia da
natureza e uma ética ambiental. Estas ecosofias vão desde a
ecologia profunda (Naess, 1989) e o biocentrismo que defende os direitos
da vida ante a intervenção antrópica da natureza, até a ecologia social
que imprime novos valores democráticos à reorganização da sociedade a
partir dos princípios de convivência, solidariedade, integração,
autonomia e criatividade, em harmonia com a natureza (Bookchin, 1991)”.
“A consciência ambiental se manifesta
como uma angústia de separação e uma necessidade de reintegração do
homem na natureza” (Leff, 1999: 117).
“A visão ecologista levou a um certo
esquematismo na definição da dimensão ambiental na educação básica. Em
muitos casos, esta se reduz à incorporação de temas e princípios
ecológicos às diferentes matérias de estudo – na língua materna, na
matemática, na física, na biologia, na literatura e na educação cívica –
e a um tratamento geral dos valores ecológicos (Unesco, 1985), ao invés
de trabalhar com a forma de traduzir o conceito de ambiente e
pensamento da complexidade para a formação de novas mentalidades,
conhecimentos e comportamentos” (Leff, 1999: 118).
“A incorporação do meio ambiente à
educação formal, em grande medida, se limitou a internalizar os valores
de conservação da natureza; os princípios do ambientalismo se
incorporaram através de uma visão das interrelações dos sistemas
ecológicos e sociais para destacar alguns problemas mais visíveis da
degradação ambiental” (Leff, 1999: 119).
“A educação ambiental interdisciplinar,
entendida como a formação de habilidades para apreender a realidade
complexa, foi reduzida à intenção de incorporar uma consciência
ecológica no currículo tradicional” (Leff, 1999: 119).
“Sem dúvida, a educação ambiental ainda
está muito longe de penetrar e trazer novas visões de mundo ao sistema
educativo formal. Os princípios e valores ambientais que promovem uma
pedagogia do ambiente devem ser enriquecidos com uma pedagogia da complexidade,
que induza os alunos a uma visão de multicausalidade e de interrelações
de seu mundo nas diferentes etapas do desenvolvimento psicogenético,
que gerem um pensamento crítico e criativo baseado em novas capacidades
cognitivas” (Leff, 1999: 119).
“Os princípios da educação ambiental não
se traduzem diretamente no currículo integrado. Desta maneira, o que
nos mostra a experiência de educação ambiental na América Latina, nos
últimos vinte anos, é uma multiplicidade de projetos educativos e de
estratégias formativas. Esta dispersão (…) expressa os interesses
teóricos e disciplinares de quem assumiu a liderança e a
responsabilidade na condução destes projetos” (Leff, 1999: 119-120).
“Os valores ambientais se induzem por
diferentes meios (e não só dentro dos processos educativos formais),
produzindo ‘efeitos educativos’” (Leff, 1999: 120).
“Estes valores, que expressam uma nova
cultura política, estão penetrando no sistema educativo formal através
da pesquisa participante e sua incorporação nos conteúdos curriculares. A
politização dos valores ambientais está presente, também, nos projetos
de educação não formal que grupos de ecologistas realizam com a
comunidade (…)” (Leff, 1999: 120).
“Desta maneira, a aprendizagem é um
processo de produção de significados e de apropriação subjetiva de
saberes” (Leff, 1999: 121).
“A educação ambiental abre um processo
de construção e apropriação de conceitos que geram sentidos divergentes
sobre a sustentabilidade” (Leff, 1999: 122).
“Os desafios do desenvolvimento
sustentável implicam na necessidade de formar capacidades para orientar
um desenvolvimento fundado em bases tecnológicas, de equidade social,
diversidade cultural e democracia participativa” (Leff, 1999: 120).
Educação ambiental e desenvolvimento sustentável
“Na educação ambiental confluem os
princípios da sustentabilidade, da complexidade e da
interdisciplinaridade. Sem dúvida, suas orientações e conteúdos dependem
das estratégias de poder implícitas nos discursos de sustentabilidade e
no campo do conhecimento” (Leff, 1999: 123).
“O discurso do desenvolvimento
sustentável não é homogêneo. Pelo contrário, expressa estratégias
conflitantes que respondem a visões e interesses diferenciados. Suas
propostas vão desde um neoliberalismo econômico, até a construção de uma
nova racionalidade produtiva” (Leff, 1999: 123).
“A perspectiva economicista privilegia o
livre mercado como mecanismo para internalizar as externalidades
ambientais e para valorizar a natureza, recodificando a ordem da vida e
da cultura em termos de um capital natural e humano (Leff, 1996)” (Leff,
1999: 123).
“Pelo seu lado, as propostas tecnicistas
destacam a desmaterialização da produção, a reciclagem dos dejetos e as
tecnologias limpas (Hinterberger e Seifert, 1995).” (Leff, 1999: 123).
“A partir da perspectiva ética, as
mudanças nos vlaores e nos comportamentos dos indivíduos aparecem como o
princípio fundamental para alcançar a sustentabilidade” (Leff, 1999:
123).
“Cada uma destas perspectivas implica em
projetos diferenciados de educação ambiental, centrados na formação
econômica, técnica e ética, respectivamente” (Leff, 1999: 123).
“O pensamento da complexidade deve se
enraizar nas bases ecológicas, tecnológicas e culturais que constituem
uma nova racionalidade produtiva” (Leff, 1999: 124).
“A globalização econômica se apresenta
como uma retotalização do mundo debaixo do signo do mercado, negando e
reduzindo a potencializada da natureza, negando os saberes tradicionais e
subjugando as culturas marginalizadas” (Leff, 1999: 124).
“A racionalidade ambiental implica em
uma nova teoria da produção, em novos instrumentos de avaliação e em
novas tecnologias ecológicas apropriáveis pelos próprios produtores;
incorpora novos valores que dão novo sentido aos processos
emancipatórios que redefinem a qualidade de vida das pessoas e o
significado da existência humana (Leff, 1994 b)” (Leff, 1999: 124).
“As distintas vertentes da
sustentabilidade terão, pois, importantes repercussões sobre as
estratégias e os conteúdos da educação ambiental. Os efeitos sobre o
processo educativo serão diferentes se o movimento para sustentabilidade
global privilegia os mecanismos do mercado para valorizar a natureza e a
mudança tecnológica para desmaterializar a produção e limpar o
ambiente, ou se está baseado em uma nova ética e na construção de uma
racionalidade ambiental” (Leff, 1999: 124-125).
“A educação ambiental foi reduzida a um
processo geral de conscientização cidadã, à incorporação de conteúdos
ecológicos e ao fracionamento do saber ambiental a uma capacitação
aligeirada sobre problemas pontuais, nos quais a complexidade do
conceito de ambiente foi reduzido e mutilado (…)” (Leff, 1999: 125).
“Neste propósito produtivista e
eficientista se dissolve o pensamento crítico e reflexivo, pessoal e
autônomo, para ceder o poder de decisão aos mecanismos de mercado, aos
aparatos do Estado e às verdades científicas desvinculadas dos saberes
pessoais, dos valores culturais e dos sentidos subjetivos (…)”(Leff,
1999: 126).
“A racionalidade ambiental conjuga uma
nova ética e novos princípios produtivos com o pensamento da
complexidade (…) requer um programa de educação ambiental compreensivo e
complexo, aberto a um amplo espectro de atividades e atores” (Leff,
1999: 126).
“Na educação formal básica, trata-se de
vincular a pedagogia do ambiente a uma pedagogia da complexidade (…).
Isto implica em revalorizar o pensamento crítico, reflexivo e
propositivo frente às condutas automatizadas que são geradas pelo
pragmatismo e pelo utilitarismo da sociedade atual” (Leff, 1999: 126).
“Quanto à capacitação da comunidade, a
inseminação de uma racionalidade ambiental (…) promove o resgate e a
revalorização dos saberes tradicionais, assim como um processo de
capacitação em que se amalgamam estes saberes com os conhecimentos
científicos e tecnológicos modernos (…)”(Leff, 1999: 127).
“As estratégias educativas para o
desenvolvimento sustentável implicam na necessidade de reavaliar e
atualizar os programas de educação ambiental frente aos consensos gerais
da Agenda 21” (Leff, 1999: 127).
“A educação ambiental formal implica em
diferentes abordagens e estratégias em sés diferentes níveis e âmbitos,
assim como no contexto de cada país e cada região do planeta. A educação
para o desenvolvimento sustentável exige novas orientações e conteúdos;
novas práticas pedagógicas, nas quais se plasmem as relações de
produção de conhecimento e os processos de circulação, transmissão e
disseminação do saber ambiental” (Leff, 1999: 127).
“Neste sentido, a educação ambiental
adquire um sentido estratégico na condução do processo de transição para
uma sociedade sustentável” (Leff, 1999: 128).
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