Cartas de Baires: Primeira condenação por agrotóxicos na América Latina
Numa
condenação considerada histórica, a justiça da cidade de Córdoba
declarou delito penal as pulverizações com agrotóxicos em campos de soja
cerca de bairros povoados. E condenou duas das três pessoas que foram
levadas aos tribunais.
Trata-se
do emblemático caso do bairro Ituzaingó Anexo, onde há 12 anos as
famílias denunciam mortes e lesões em conseqüência do uso de
agrotóxicos.
Sobre
uma população de cinco mil habitantes, entre 2002 e 2009 morreram 272
pessoas, 82 delas de câncer. No mesmo período foram registrados 272
abortos e 23 crianças nasceram com malformações congênitas. Até setembro
de 2010 se registram 143 pessoas com câncer.
A
pena, em si, foi uma decepção. Os moradores queriam cadeia para os
produtores agropecuários Jorge Alberto Gabrielli e Francisco Parra, e
para o agente pulverizador Edgardo Jorge Pancello, por usarem o
herbicida glifosato e o inseticida organoclorado endosulfan.
Mas
a Câmara do Crime de Córdoba impôs três anos de prisão condicional para
Parra e Pancello, e absolveu Gabrielli por falta de provas. A sentença
indica também que Parra tem que fazer trabalhos comunitários durante
quatro anos e não pode usar agroquímicos por oito. Pancello também
deverá fazer serviços comunitários e ficou inabilitado para aplicar
produtos agroquímicos durante dez anos.
Mesmo
assim a condenação é importante, porque pela primeira vez a atividade
de pulverização com agrotóxicos cerca de áreas urbanas foi considerada
um delito na Argentina – e na América Latina.
Isso estabelece jurisprudência para todo o continente, onde há milhares de ações contra produtores rurais, e pode chegar a alcançar as multinacionais fabricantes de agrotóxicos.
A
luta em Córdoba começou pela determinação de uma das mães do bairro,
Sofía Gatica, que em 1997 perdeu um bebe que havia nascido sem os rins.
Ela demorou a juntar uma coisa com a outra, até que percebeu um número
pouco usual de mulheres com lenços na cabeça e crianças com máscaras a
caminhar por Ituzangó.
Sozinha,
começou um levantamento, e já naquele ano detectou 97 pessoas com
câncer só no seu bairro! Hoje se sabe que a taxa de câncer na região é
30 vezes maior que a média nacional (dados da Organização Panamericana
de Saúde) e que das 142 crianças entre dois e seis anos da localidade, 80% possuem tem agrotóxicos no organismo: chumbo, arsênico e PCB (elemento presente em transformadores elétricos), entre outros. Outros dados em http://www.juicioalafumigacion.com.ar/
Os
cultivos transgênicos na argentina, sujeitos à pulverização, cobrem 22
milhões de hectares e efetam, direta e indiretamente, a 12 milhões de
habitantes. Mas o tema não é preocupante somente aqui.
Há
três anos o Brasil ocupa o primeiro lugar no ranking de consumo de
agrotóxicos no mundo segundo a Associação Brasileira de Saíde Coletiva
(Abrasco). Apenas na safra de 2011 foram usados 835 milhões de litros de
herbicidas, fungicidas e inseticidas. O consumo por habitante chega a
cinco quilos de agrotóxico por ano.
É de parar para pensar.
Nenhum comentário:
Postar um comentário