A floresta de alimentos da pequena propriedade rural - Frutifloresta, um espaço de coleta de alimentos
Antônio Roberto Mendes Pereira
A idéia de ter uma floresta de alimentos encanta muitas pessoas. Já
imaginou um espaço onde você e alguns dos seus animais domésticos
pudessem encontrar 80% dos alimentos necessários? Pois bem, a intenção
deste texto é ensinar a montar um pomar como se fosse uma floresta de
alimentos, uma frutifloresta, onde a maioria das fruteiras adequadas ao
tipo de solo e clima do local escolhido pudessem se desenvolver
sustentavelmente. A diversidade vegetal e animal deve ser um dos
princípios básicos desta floresta, onde cada elemento apóia e
complementa as necessidades de outras espécies. Cada elemento que vai
compor este sistema deve executar mais de uma função, para que este
agroecossistema possa aumentar a sua capacidade de suporte de
sustentabilidade.
Na Permacultura este espaço é conhecido como Zona II, é o espaço também
considerado como área de segurança alimentar para toda a família e para
alguns animais.
Em muitas propriedades este espaço já não existe, já foi absorvido pela
monocultura comercial. Um pé ou outro de fruta ainda resiste às
investidas de ser arrancadas. Em muitas propriedades já nem se lembra
mais quando foi plantada uma fruteira, alegando-se que demora muito para
produzir. O imediatismo é a postura que direcionam muitas das tomadas
de decisões. Qualquer atividade que demande mais tempo é logo rejeitada.
A rotação financeira rápida é o lema. Fazer investimento que demore
muito tempo, utilize-se muito dinheiro e mão de obra é considerada
decisão errada. O negócio é atividades que se invista pouco recurso
econômico, e que gere resultados não para amanhã, mas para ontem. Como
repensar esta forma de planejar é a intenção que deve permear este
texto.
Devemos partir do pressuposto de que em uma floresta não falta alimento
para quem nela habita e vive logo, como montar esta Zona II seguindo a
mesma lógica da floresta natural? O que devemos fazer?
Como aproveitar de forma eficiente e eficaz a energia do sol? Do vento?
Os nutrientes que estão presentes neste ambiente (solo)?
A lógica é a seguinte: Em uma floresta natural e nativa para nós os
seres humanos encontrarmos alimento que atenda nossa dieta de forma
suficiente é difícil. Somente 10% a 20% é o percentual que podemos
encontrar, porém nossa intenção é aumentar este percentual na floresta
por nós montada. Pretende-se alcançar de 40% a 60% da dieta da família
responsável por sua implantação.
Em uma floresta de alimentos projetada, tudo ou quase tudo deve ser
pensado, projetado, estudado, as plantas são escolhidas, selecionadas,
com a intenção de atender as demandas da família e de outras famílias
que não sejam unicamente as humanas. Muitos seres vão compor este espaço
de forma que uma espécie apóia aos demais componentes do espaço.
Precisamos aprender a aumentar a capacidade de suporte da floresta
projetada, e muitas estratégias podem ser utilizadas, principalmente na
escolha dos elementos que vão compor este espaço.
Qual seria a lista das frutas que você gostaria de produzir? Porém,
elimine as de impossível adaptação, pense no que for possível e adequado
ao clima, ao solo, a quantidade de água disponível e a radiação solar
que a área recebe. As espécies de frutas indígenas nativas devem compor
este espaço, elas já foram testadas durante gerações e gerações, logo
precisam compor este espaço. Dê preferência pelas nativas no lugar das
importadas, trazidas de outras regiões. Porém nesta escolha nunca
permita que de uma mesma espécie ultrapasse 10% do total das espécies
que vão compor o espaço.
ESTRATÉGIAS QUE PRECISAM SER ANALISADAS E OPERACIONALIZADAS
REDUZIR A DISTÂNCIA DA COMIDA E DIMINUIR A NECESSIDADE DA COMPRA – Estas
são as principais intenções com a implantação da floresta de alimento.
Quanto mais próximo da casa menos gasto com energia para colheita e com a
manutenção deste espaço. É de praxe na Permacultura que a Zona I e a
Zona II, são espaços de segurança alimentar, devem ser similar ao
supermercado para a família, ela deve ter quase todas suas necessidades
alimentares atendidas por estes dois espaços produtivos. Espaços estes
onde a família não precise se deslocar grandes distâncias para fazer sua
feira ou coleta diária de alimento. Por estes alimentos estarem tão
próximo da casa, evita-se o uso de geladeira para conservar os mesmos, a
melhor maneira de conservar os alimentos é na própria árvore, só
coletando o estritamente o necessário para o consumo diário. Com esta
atitude a qualidade e a quantidade dos alimentos são mantidas, além de
evitar a compra.
O POSICIONAMENTO DA FLORESTA DE ALIMENTO – Um dos princípios da
permacultura é o da “Localização relativa ou integrante”, onde o
elemento está mais bem localizado quando ele consegue aumentar o nível
de conexões entre ele e os demais elementos que compõe o sistema. Logo,
quando se for escolher a área para montar o pomar ou a floresta de
alimento, precisamos está atento a este principio. Embora que a melhor
localização para esta floresta é logo após a Zona I, pois os critérios
que precisam ser considerados são: produtividade, necessidade de água,
energia e manutenção do espaço. A floresta não necessita de tanta
manutenção quando comparada com a Zona I, portanto é posicionada logo a
seguir.
POMAR PARA TODAS AS CULTURAS – Quanto mais diversidade, mais rico e
sustentável será este ambiente. Muitas culturas devem compor este
espaço, porém sempre levando em conta, que quanto mais nativa a espécie
for mais condições de permanência e produção terá. Devemos ter espécies
de plantas que garantam uma produção durante todos os meses do ano.
Neste espaço devemos ter plantas de vários andares (altura) para que
possamos ao máximo imitar uma floresta nativa. É obvio que neste espaço
não só terá plantas cultivadas, devemos entender que a natureza também
vai querer incluir alguns representantes que ela acha necessário,
respeite e controle o excesso. A diversidade deste espaço garante uma
mesa diversificada, farta e rica, com alimentos de alta qualidade
biológica ou nutricional. Garanta o resgate de espécies frutíferas da
região que estão ficando esquecidas ou que seja difícil de encontrar, e
ou que não estão sendo plantadas mais com freqüência. E lembre-se que a
maioria das fruteiras requer máxima exposição ao sol e devem ser
plantadas nas encostas voltadas para o sol, porém com o solo protegido
da radiação solar é claro.
Não perca as sementes e os caroços das frutas depois de consumidas. Não
perca o potencial genético que foi produzido e agora necessita ser
multiplicado. Faça uma pequena sementeira e aproveite ao máximo este
material. Se não quiser fazer mudas pelo menos escolha uma área e lance
as sementes em espaços que elas possam ter a capacidade e a
possibilidade de se multiplicar espontaneamente, mas não transforme este
capital genético em lixo.
AS ESTAÇÕES DO ANO – Muita influência tem as estações do ano no
desenvolvimento e produção das frutas, precisa-se está alerta para os
períodos de cada estação climática. As fruteiras vão necessitar de
alguns cuidados como em algumas estações a necessidade por água pode
aumentar, em outras a concorrência com outras espécies mais adaptadas
podem atrapalhar o desenvolvimento de algumas, em outros momentos o frio
pode paralisar o crescimento, enfim precisa-se estar atentos para
ajudar que as mesmas consigam ultrapassar estas possíveis dificuldades
fenomenológicas.
Na escolha das variedades dos representantes que vão compor o espaço
devem-se selecionar espécies que possam ter alguns representantes
produzindo durante todas as estações do ano. Garantindo que pelo menos
parte do pomar esteja produzindo alimento naquele período ou estação do
ano.
Construir o calendário de safras das fruteiras existentes ajuda muito na
manutenção do manejo do pomar. Pois no momento da floração até o fruto
ficar no ponto de colheita muita coisa pode acontecer, logo é bom estar
alerta.
FORMA DAS COPAS DAS FRUTEIRAS – É preciso conhecer o formato e o tamanho
de cada fruteira que foi escolhida para compor o espaço. Com isto
respeitam-se as distâncias necessárias de cada espécie, evitando super
dimensionamento entre as elas. O formato das copas vão nos ajudar na
arrumação e na distribuição de quem deve estar próximo de quem. Vários
são os formatos das copas, mas cada formato tem suas pretensões em uma
serie de demandas que foram moldadas para atender a estas necessidades.
Algumas fruteiras têm seus frutos expostos ao sol para amadurecer como
no caso da mangueira, goiaba, laranja entre outras, estas necessitam de
mais sol, mas também têm outras que protege seus frutos do sol, estes
exigem menos sol para amadurecer, como é o caso da uva. Estes
comportamentos das espécies precisam ser levados em conta na hora da
arrumação.
INTRODUÇÃO DOS ANIMAIS NA FLORESTA DE ALIMENTOS – Antes da tomada de
decisão de quais animais domésticos irá fazer parte do sistema
precisamos responder as seguintes perguntas:
· Este animal é adequado ao clima?
· Existem variedades adaptadas deste animal na região?
· Qual será o impacto que este animal pode causar ao sistema?
· Quanto de espaço este animal necessita?
· Quais os hábitos deste animal em relação à reprodução?
· Este animal pode ser criado junto de outras espécies?
· Qual é o hábito alimentar deste animal? Dê preferência pelos onívoros, que comem de tudo.
· Quais outras funções este animal pode desempenhar no sistema?
É bom lembrar que animais grandes e destrutivos não são apropriados para
serem criados na floresta de alimentos. Bovinos, cavalos compactam o
solo, quebram muitas galhas além de comer muitos frutos. Os pequenos
animais são mais adequados. Pássaros, abelhas, galinhas, coelhos, e até
mesmo porcos, são mais adequados para participarem deste espaço
produtivo.
OS ANIMAIS E AS POSSÍVEIS FUNÇÕES NO SISTEMA – Todo ser vivo exerce
várias funções no sistema onde está inserido. Estas funções colaboram na
sustentabilidade do ambiente. Uma das grandes vantagens da criação dos
animais livres é que eles podem exercer funções que consolidam sua
existência no ambiente. Diferentemente de se criar um animal preso, para
melhor entender imagine que uma galinha presa para provar sua
existência basta que ela ponha ovos e produza carne, completamente
diferente no caso desta galinha viver solta, ela prova sua existência
controlando insetos, diminuindo as ervas, fertilizando o ambiente, entre
outras. Como se percebe quanto mais este animal for criado utilizando a
lógica da natureza mais funções ele pode exercer no ambiente, no nosso
caso na floresta de alimentos.
As
abelhas exercem além da polinização exercem muitas outras funções de
grande importância no sistema. A produção de mel, cera, própolis entre
outros já justificam a necessidade de sua presença nesta floresta. Dê
preferência pelas melíponas, pois não exigem caixas mobilísticas e
muitos apetrechos para sua criação. Seu manejo também é muito mais
simples que as abelhas do gênero Ápis. A presença de abelhas no sistema
me exige mais cautela nas minhas atitudes de manejo.
As galinhas são de grande ajuda no sistema, pois ciscam, comem insetos,
controlam alguns tipos de ervas, contribuem na fertilização da floresta,
espantam alguns tipos de cobras, além de contribuir com a
diversificação e produção de alimento que é um das maiores intenções
produtiva da floresta.
Os patos e os gansos também são de uma ajuda tremenda, pois controlam
grande variedade de gramas e forragem e outras ervas, ajuda na
fertilização do solo e dos corpos d água do espaço. A fertilização da
água contribui enormemente na alimentação de algumas espécies de peixes.
Ajuda na oxigenação de lagos e lagoas através da sua movimentação
dentro da água, contribuindo na sobrevivência dos peixes. Tem uma grande
diferença das galinhas, pois não tem o hábito de cisca. De seis a doze
gansos em meio hectare podem manter muito bem um pomar.
Os pássaros também exercem funções importantíssimas no equilíbrio desta
floresta, são eles responsáveis pela disseminação de parte de sementes
de frutas e de outras plantas, quando se alimentam e também quando
estercam, comem grande quantidade de insetos, além de tornar o ambiente
mais bonito em beleza e na sonoridade.
A ÁGUA NA FLORESTA DE ALIMENTOS – Sem ela o sistema não terá a
estabilidade necessária. Várias estratégias precisam ser montadas para
que este líquido possa ser captado e armazenado no solo. Um dos
princípios da Permacultura diz que toda função importante deve ser
executada por vários elementos, e a captação da água é função muito
importante que precisa ser executada por vários elementos. A copa das
arvores foram projetadas para naturalmente para captar os raios solares e
água.
O solo deve ser a grande caixa de água, onde toda água da chuva é
captada e armazenada. As folhas que cobrem o solo, além de ser uma
esponja que facilita a infiltração também serve de filtro limpando parte
dos resíduos sólidos de arrasto. Uma boa estratégia para aumentar a
quantidade de folhas que possam aumentar a proteção do solo é o plantio
de cultivos de plantas de cobertura verde de solo. Estas plantas além de
proteção também iram servir de adubação, durante sua decomposição.
Açudes, canais de infiltração, lagos e lagoas são também estratégias que
aumentam a captação e o armazenamento de água para o sistema.
O JOGO DE ESPAÇO, LUZ E NUTRIENTES – Este é o grande desafio na montagem
deste sistema, precisa-se aprender a equilibrar esta equação onde estes
três componentes precisam interagir de forma permanente. A falta ou a
demasia de um deles pode trazer problema para os elementos vivos que vão
fazer parte deste sistema. Ao organizar a distribuição das fruteiras
leve em conta a necessidade de luz e de espaço de cada espécie,
identifique de que lado vem o sol e coloque as plantas mais exigentes
neste lado. Aprenda aproveitar de forma eficiente tudo que esta
disponível naturalmente nesta área. Lembre-se que toda fruteira
necessita de espaço para se desenvolver adequadamente.
ALIMENTANDO O POMAR – Após estabelecer as plantas de coberturas e as
leguminosas que devem fazer parte deste ambiente, permitam que alguns
animais entrem no sistema como exemplo galinhas, patos e dependendo da
maturação do sistema alguns porcos, eles vão ajudar também a manter o
pomar, suprindo o ambiente de adubo. Reviram, ciscam, pastam ajudando a
manter o sistema vivo e ativo.
MANEJO DE PRAGAS – Todo ambiente fértil e diverso dificilmente acontece o
aparecimento de pragas e doenças. A estabilidade se instala com muita
facilidade quando no ambiente a diversidade é instaurada. Vão existir
insetos no sistema até porque eles também fazem parte do ambiente. Porém
dificilmente se tornam pragas. A presença de inimigos naturais vai
controlar quaisquer pequenos desequilíbrios que porventura venham
ocorrer no sistema. Não fique surpreso se logo no início da instalação
da floresta venha surgir estes desequilíbrios, lembre-se que o sistema
ainda está buscando seus próprios equilíbrios estáticos de população de
insetos.
A PODA NO SISTEMA – Existe muita controversa sobre o uso desta prática. O
formato natural de uma planta foi projetado naturalmente para que ela
consiga atender a sua necessidade de luz, pois cada folha que brota tem
várias tarefas e entre elas ela deve realizar fotossíntese em algum
momento do dia, cumprindo uma das funções de ser folha. A poda desarruma
esta projeção natural dos galhos, fazendo com que muitas das folhas não
realizem esta função (fotossintetizar) por não receber a luz do sol.
Outro detalhe da sabedoria e experiência popular diz que você sempre
terá a mesma quantidade total de frutas de uma árvore. Você pode colher
muitas pequenas e algumas poucas grandes, e com a poda você terá poucas
grandes que terminam por equivaler pelo maior número das pequenas. Pense
bem antes de tomar a decisão de realizar podas, uma vez fazendo todos
os anos necessitará repetir a operação.
Não é tão difícil montar uma floresta de alimentos que possam atender
grande parte da necessidade de alimentos da sua família. Empenho e
dedicação e observação dos sistemas naturais é a receita básica para
grandes resultados. Esta floresta de alimentos precisa alcançar os
seguintes pontos básicos necessários para a sustentabilidade:
· Que ela auto se mantenha;
· Que ela auto se regule;
· Que ela auto se organize
Busque montar sua floresta tendo como norte para serem alcançados estes
três pontos básicos, e você se surpreenderá com os resultados. Você terá
a satisfação de ter uma floresta particular cheia de alimentos, muita
beleza, tranquilidade além de estar contribuindo com o equilíbrio do
meio ambiente de forma intensa.
Nenhum comentário:
Postar um comentário